Há muito tempo havia um rei muito malvado que por qualquer motivo condenava seus súditos a pena de norte por decapitação. As injustiças, os crimes por ele praticados eram tantos que Olodum resolveu mandar Exú verificar o que estava se passando com ordem de punir o malvado da maneira que ele bem entendesse. Exú então, disfarçado de alfaiate chegou à cidade onde se estabeleceu com sua nova profissão. O tempo passou até que certo dia um homem pediu a Exú que lhe fizesse um manto e utilizando-se de uma bela peça de tecido negro como a noite. Exú atendeu mais que satisfatoriamente a encomenda de seu freguês. Antes de entregar o manto a seu dono, Exú chamou Ikú, nossa grande senhora morte, e exibindo sua obra lhe fez a seguinte proposta:
“– Gostaria de possuir este manto?” e a morte disse:
“– Claro que sim, infelizmente não possuo dinheiro suficiente
para adquiri-lo, se tivesse, sem dúvida o compraria agora mesmo.”
“– Pois este manto poderá ser seu se dentro de sete dias
vieres buscar a pessoa que o tiver usando.”, confidenciou então Exú.
“– E assim basta que eu venha buscar dentro se sete dias quem
estiver vestido, para que eu possa ser dono deste manto?”
“– Não tenha dúvida.”, respondeu Exú.
“– Dentro de sete dias então virei buscar o manto e quem
estiver dentro dele.” Respondeu a morte ansiosa com os olhos brilhante sobre a
peça.
E Ikú retornou ao mundo dos mortos, contando os dias que
faltavam para que pudesse vestir o seu belo manto. No dia seguinte, o freguês
veio buscar a sua encomenda, mostrou-se muito satisfeito com o trabalho do novo
alfaiate. Ficou, olhou, provou e disse:
“– Recomendarei os seus serviços a todos os meus amigos,
tenho certeza que gostarão, sou muito bem relacionado e posso conseguir uma boa
clientela.”, disse o homem agradecido pelo trabalho.
“– Se é verdade que podes me ajudar, gostaria que vestido com
esse manto fosse passear nas imediações do palácio real, de forma que o próprio
rei pudesse admirar minha obra e dessa forma torna-se meu cliente”, disse Exú.
“– Sim, é claro, irei passear diante do palácio e se
perguntarem quem fez este manto darei o seu endereço”, e vestido de boas
intenções, lá se foi o homem desfilar diante do palácio real. O rei muito mal,
tinha um filho, rapazinho de 16 anos, cheio de vontades, mas de péssimo
caráter, ruim como seu próprio pai. O rei jamais negara nenhum pedido ao filho,
fazia todas as suas vontades, atendia todos os seus caprichos e aí então, ai
daquele que ousasse contrariar o príncipe, logo teria a cabeça separada do
próprio corpo. E Exú então, aguardando o fruto da ambição brotar, germinar,
amadurecer. E quem viu o homem vestido com o manto feito por Exú não foi o rei,
mas sim, o seu filho herdeiro.
“– Pai, pai, quero para mim o manto negro que aquele homem
está vestindo.”, pediu o jovem, apontando para a direção do infeliz que passava
distraído. Imediatamente o rei mandou prender o homem e inventando uma desculpa
qualquer, condenou-o a morte por decapitação, dessa forma, seu filho poderia
usar o manto, sem que ninguém reclamasse sua propriedade. E o príncipe então
vestiu a roupa que não tirou mais do corpo. No dia da execução, Ikú foi chamado
para levar o condenado, o pobre inocente condenado. Esta era a sua missão.
Na hora marcada, todos vieram ao patíbulo,
inclusive o príncipe com o seu manto novo, jamais perdera um espetáculo como
aquele e não seria naquele dia que deixaria de exibir a todos sua roupa nova e
com certeza Ikú chegando ao local e vendo o manto lembrou-se da promessa de Exú
e agindo com extrema presteza pegou o alfanje das mãos do carrasco decepando a
cabeça do príncipe e arrancando-a do corpo ainda com vida. O manto negro confeccionado
por Exú, ele vestiu imediatamente. O povo que vivia insatisfeito com o tirano,
vendo o que se passava pensando tratar-se de uma revolução, invadiram o
patíbulo matando também o rei e libertando o prisioneiro que foi por eles mesmo
coroado rei. E foi assim que Exú puniu o déspota, eliminando ele e sua
descendência para que o novo monarca pudesse reinar com justiça sobre aquele
povo até então oprimido e é por isso que até hoje Ikú se veste com o manto
totalmente negro, presente de Exú por um pequeno favor prestado.
Ensinamento: Esse itan com certeza revela que o
justo pode pagar pelo pecador desde que esse justo esteja copiando os maus
costumes, os maus vícios. Esse itan revela “diga-me com quem andas que eu direi
quem tu és”. Esse itan também revela que a justiça tarda mais não falha e não
tem caminho para que ela chegue. E miticamente falando revela o estreito
caminho entre Exú e a morte, por ser o senhor das estradas, o senhor do longe e
do perto, o senhor de ontem, do hoje e do amanhã, o senhor da distância
inexistente.
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